sábado, 17 de fevereiro de 2018

Precisamos falar sobre... #12: A Escrava e a Fera e o problema da romantização na literatura


Olá, pessoal! Como vão? Como foram de carnaval?
Eu espero que bem! Estamos de volta com a programação normal.
E mal a gente volta do carnaval e um post desse gênero se faz necessário.
E claro, as tretas do mundo literário não vão parar nunca, eu tenho certeza. Ainda mais que eu estou em vários grupos que rolam tretas quase que diariamente.
Nesses últimos dias rolou a divulgação de um livro que eu diria problemático, chamado "A Escrava e a Fera". Eu vi por esse post aqui no facebook e seguem fotos também!

A começar pelo "belo" título e o "uma versão de a Bela e a Fera". Já tem muita coisa errada acontecendo só com o título. A ilustração acho que nem tanto porque realmente os escravos eram marcados com ferro quente.
Vamos ao outro grande problema, a sinopse:

"A dor pode transformar, mas o amor é capaz de curar...
Brasil 1824.
Amali foi arrancada do seio de sua família na África, transportada em condições desumanas em um tumbeiro, que atravessou o atlântico, e vendida como escrava. Os pesadelos só parecem piorar quando não é capaz de compreender nem os outros que vieram na pavorosa viagem com ela. Presa como um animal, vendida em um mercado negreiro e marcada a ferro vai passar por sofrimentos que jamais imaginou quando vivia em sua terra natal. Ela se tornará escrava domestica de um recluso e frio barão, produtor de açúcar do interior de Minas Gerais, que possui mais marcas do que aquelas que tenta esconder. Sua curiosidade, fará Amali questionar sobre a ala queimada do casarão e trará à tona lembranças que ele tenta esquecer a todo custo. Em meio a dor, o amor florescerá de uma maneira inesperada para curar a cicatrizes de ambos."

Sério? Que sinopse mais infeliz!
A começar que tem uns erros de pontuação bem na nossa cara. Tipo, a mulher virá escrava e vai se apaixonar pelo senhor? O amor vai curar as feridas? Olha, o amor ajuda em muitas coisas, mas ainda acredito que o melhor remédio é o tempo, mas isso não tem a ver agora.
A Bela e a Fera já é uma obra problemática por si só, tratando da síndrome de Estocolmo e tal, mas passar essa ideia para um período tão conturbado da história do Brasil... Ai tem um erro terrível!
Sei que não é nem meu lugar de fala, porém vi muitos negros extremamente ofendidos com este livro e com razão. Escravidão é algo que afeta os negros em nossa sociedade até hoje e de uma forma ruim.
Não quer dizer que não se pode falar sobre isso, é história e não tem mesmo como apagar, mas se for tratar tem que ser com muito cuidado porque qualquer deslize fere uma parte da população.
Gente, tá romantizado mesmo. Esfregado na nossa cara! A escrava se apaixona pelo seu dono que não é nada do que ela realmente pensa. Ele é até "bonzinho".
Onde eu já vi um plot parecido? Ah sim, no meu livro.
Eu lembro de ter compartilhado dizendo que até lembrava um pouco o meu livro - O Diário da Escrava Amada - e que deveria se ler o livro em questão para tirar suas próprias conclusões. Porque sim, já me falaram que pensaram que meu livro ia romantizar a situação, mas nem de perto isso acontece. Claro que uma coisa muda e muito: o cenário é fictício.
Bem, não vou ficar falando do meu livro aqui. Voltando ao tema.
A repercussão foi enorme que até saiu no BuzzFeed. E claro que a autora tinha que se justificar. Você sabe que a coisa é séria quando a pessoa tem que se justificar. Ela se justificou dando todos os spoilers possíveis do livro, olha aqui. Disse inclusive que vai trocar o título e refazer a sinopse.
Não tem nada de errado em escrever sobre, mas romantizar que é a questão aqui.
Amail pode ser uma mulher a frente de seu tempo e coisa e tal, mas com o senhor tem aquela "ele não é bem assim, ele sofreu muito no passado dele, tadinho". E a escrava não? Tirada a força da terra natal, vendida como mercadoria. Ela tá de boas né?
Sem contar o detalhe que isso é um livro paradidático, o que aumenta em 300x o nível do problema. Espero que nenhuma queira colocar este livro na lista. Oremos por isso!
Não posso dizer muito além disso do livro, até porque eu não li e nem irei ler. Mas, teve uma moça que fez resenha. Vou deixar um trecho da resenha:

"Além de tudo, o livro ainda passa uma mensagem que o amor romântico cura tudo, que o amor transforma. Isso é algo extremamente preocupante! Muitas meninas e mulheres estão em relacionamentos abusivos, com a ideia de que se elas forem boas o suficiente, vão conseguir transformar uma fera num príncipe. E se não há essa transformação a culpa é delas. Não, o amor não cura tudo, o amor não transforma! Parem de reproduzir isso! Já passou da hora de parar de romantizar relacionamentos abusivos." (Lorrane Silva)

Cheguei a ler esta resenha e foi ela que me fez ter ainda mais vontade para fazer esta postagem.
E a questão da romantização não é só com este livro, mas com muitas obras consagradas. O maior exemplo disso é 50 Tons de Cinza. Outro exemplo é o Lolita, que é contado do ponto de vista do homem/abusador. Ai já viu né?
Falando que é legal o cara ser um escroto, que por trás de toda aquela grosseria existe um bom coração. (ELE É TSUNDERE NÉ GENTE?)
Que tudo bem você estar numa relação ruim, mas é melhor do que estar sozinha.
E quantas obras que fazem sucesso no Wattpad que não são sobre isso? Quantas pessoas não estão presas em relacionamentos tóxicos por achar que "o amor cura"?
Só mais uma coisa antes de terminar: A autora ganhou uma divulgação monstruosa com isso. Ou seja, publicidade negativa funciona de uma maneira assustadora.
Será que alguém pode falar um pouco mal do meu livro aí para ajudar? #zoas
E se eu falar que apareceu uma pessoa na minha página de autora ontem perguntando se dava para falar com a autora do livro? Pois é, aconteceu! #incrédula
Só isso! E ai, o que vocês acham dessa polêmica de "A Escrava e a Fera"?

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